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rotina
Minha vida cotidiana está cada vez mais uma eterna rotina. Acordar cedo para o trabalho, academia às segundas, quartas e sextas; mercado ao sábado, levar o cachorro ao petshop pela manhã; segunda e quartas ir à pós-graduação. E, para quem tem filhos, rotinas e deveres ainda maiores.
Procurando dar uma certa ordenação à vida, vou me roteirizando no dia a dia e não dou espaço para o inesperado. Passo a agir como verdadeiro robô e acabo por levar uma vida mais mecânica, repetitiva.
O mesmo trajeto para a casa, os mesmos restaurantes, a mesma pizzaria, os mesmos programas e séries de TV. Até me faz lembrar famosas músicas de antigamente:”Eu nasci assim, eu cresci assim, e sou mesmo assim, Gabriela”. Ou então “A mesma praça, o mesmo banco, as mesmas flores…”
Vida monótona. Repetição, acomodação, alienação, inércia. Estou no piloto automático.
Essa rotina entra numa perigosa automatização das coisas de modo inconsciente e me deixa escapar coisas importantes, como aniversários, atenção aos amigos e parentes, dia de ir ao médico. Também não me permite experimentar o novo, o diferente. Aquele restaurante que abriu recentemente, aquela viagem “bate-volta” no fim de semana ou aquele cara mais velho que conheci na balada.
Eu, um robô?
Estou quase lá. Um robô perdido no espaço e perdido no tempo. E sem saber que o tempo voa….
Acordo, lavo o rosto, olho no espelho e levo um susto! Mais um dia de bad hair… Isso me diz que teremos um dia nublado, de chuvas esparsas e, provavelmente, com o Cristo e Pão de Açúcar encobertos.
Os seres independentes que habitam minha cabeça denunciam as alterações climáticas e, normalmente, tornam o meu dia em uma espécie de saga de muitas provações, até encontrar novamente um raio de sol.
Passado o desespero, começo a luta para adestrar os fios rebeldes:
1. Muito shampoo;
2. Massageio os fios;
3. Altas doses de condicionador;
4. Mais massagem nos fios;
5. Tiro a umidade com toalha (JAMAIS agite os fios);
6. Pente, somente de madeira!
7. Inicio a operação secador;
8. Rezo!
9. Um pouco de creme antifrizz.
10.Seco a raiz;
11. Rezo para não desfazer os cachos e manter a raiz baixa;
12. Deixo o secador quente e amasso as pontas;
13. 15 minutos depois, vamos para o espelho!
Seco os cabelos sentada no puff, a cinco passos do espelho. Esta caminhada me provoca calafrios. E então vamos ao resultado…. com frizz! Operação escova na franja e uns rolinhos para definir os cachos. Enquanto isso, corro para me vestir. Café da manhã? Esquece! Prioridade é definir os cachos e uma boa maquiagem para ninguém reparar nos cabelos espantados.
Socorro! Estou atrasada e tenho reunião com o chefe. Entro no carro ainda com os rolinhos na cabeça, um trânsito infernal. Como está chovendo para o trânsito, quer dizer, não só para, mas praticamente me faz ficar estacionada
Enquanto isso recebo um WhatsApp do meu chefe: “não esqueçam da reunião”.Claro que sou a última a chegar, porque após estacionar o carro, precisei tirar os rolinhos da cabeça.
E qual a pergunta do meu chefe? “O que você fez neste cabelo hoje? Está diferente…” E eu penso: ” Sim, está chovendo!” Mas, respondo: “Nada….me desculpe o atraso”. Em seguida, pego discretamente um elástico e prendo os bandidos!
Não é por nada, mas com qual intensidade as metas que criamos para alcançar um sucesso idealizado nos têm usurpado dos pequenos prazeres da vida?
Abdicamos diariamente da liberdade dos pés descalços pelo requinte e formalidade dos saltos agulha. Almoçamos as atividades que não couberam nas outras 14 horas de expediente e voltamos ao escritório para assistir reuniões de puro engodo.
Reforçamos uma imagem incorruptível e de excelência. Mas, quanto se vive enclausurada no armário? Quanta sede dissimulada por pequenas doses? Quanta opinião em silêncio? Quanta maquiagem retocada?
Dormimos na exaustão das metas até que o despertador nos convoque para sermos a protagonista na fábula de outro slide. Caminhamos como sobreviventes até que a sexta-feira chegue e, com ela, a prerrogativa de poder extravasar nossa crise crônica consumindo o ócio.
Não namoramos durante a semana. Não saímos para dançar. Não vamos ao estádio ver o “timão”.
O algoritmo da rotina nos faz flutuar do apartamento ao carro e do carro ao escritório com pequenas pausas de ambiente sem ar-condicionado. Ao volante, qualquer percurso é de exaustão, as buzinas não nos deixam ouvir o rádio nem os nossos pensamentos.
É um laço, é uma corrente, e também somos um elo para que o ciclo recomece.
É preciso ter ímpeto para fugir dessa cadeia. É preciso dizer sim às aventuras que ficam do outro lado da fronteira cotidiana. É preciso mudar a rota que nos tira e nos devolve ao lar. Alguns dias é preciso por a cara na janela para respirar a vida.
Existem vantagens em ser uma pessoa desprovida de preconceitos, mas sem dúvida a mais divertida e enriquecedora dessas é que as pessoas se sentem à vontade de falar sobre qualquer coisa com você.
Eu usufruo dessa vantagem aprendendo com a experiência dos outros. Acho fantástico quando alguém me procura e diz: Só consigo contar isso para você.
Que maravilha! Que oportunidade única!
Hoje foi um dia de aprender com uma dessas oportunidades. Vanessa, minha amiga que está casada há 8 anos, me convidou para almoçar, pois estava aflita com uma situação.
Ela me contou que cedeu a um grande desejo de seu marido, transar com duas mulheres. Não pensem que foi fácil para ela aceitar essa situação. Desde o início do casamento, sempre que ele bebida um pouco, costumava dizer que tinha vontade de ir ao puteiro como nos tempos de solteiro, mas que não queria fazer nada escondido dela e que só voltaria a este antro de perdição se ela o acompanhasse. Ela questionava, queria entender, mas não havia uma explicação razoável, além de uma tara ou fantasia.
Pois bem, quando o casamento começou a dar sinais de que a chama da fogueira da paixão tinha se tornado uma tênue luz de vela, ela começou a considerar o assunto. Quem sabe assim a vida sexual voltasse a ser como era no início e seu casamento estivesse a salvo.
Estavam eles no bar, e novamente a proposta do marido apareceu. Ela sempre se sentia incomodada com isso, por não se achar suficiente para ele e também por ter receio de ficar nua perante outra mulher, que provavelmente seria mais gostosa que ela. Porém, naquela noite, ela decidiu encarar o grande desafio. Foram a um puteiro e ele pediu duas prostitutas para acompanhá-los. Isso mesmo, duas, pois o cara quando é abusado gosta de exagerar para mostrar que pode.
Ela já tinha tomado duas taças de vinho e achou melhor não beber em um ambiente que para ela, de certa forma era hostil. Ele que já tinha bebido bastante continuou na mesma pegada e até usou uma droga ilícita, fornecida por uma das moças.
O rala e rola começou, mas o cara não conseguiu chegar nem ao primeiro round e apagou. Ela já tinha começado a brincadeira e de certa forma, sem me contar muitos detalhes, contou que brincou mais um pouco e depois ficou conversando com as garotas que a elogiaram bastante e questionaram o por quê dela perder tempo com o tal cara.
No dia seguinte, ressaca moral.
Ela reclamou que ele a tinha, de certa forma, largado sozinha em um ambiente hostil e que a noite que era para ser uma fantasia entre eles, não passou de uma experiência desagradável com ele, mas como um grande impulsionador de sua autoestima, pois as garotas gostaram da companhia.
Ele ficou revoltado, se colocou como vítima da situação, que só bebeu pois não conseguia encarar a situação sóbrio, e que ela não prestava por ter coragem de encarar a situação de forma tão natural.
Após discutirmos alguns detalhes do tema, chegamos à conclusão que o marido da Vanessa, nunca imaginou que ela toparia tal situação. Ele usava essa fantasia para se autoafirmar e limitar a autoestima dela. Porém, quando ela aceitou o desafio, o tiro saiu pela culatra para ele.
E agora? Como fica esse casamento?
Provavelmente não fica. Vanessa não admira mais o marido, que se já não dava conta dela antes, imagina agora que ela sabe que é mais poderosa que ele. Além disso, ele deixou de ser confiável à medida que não assumiu suas responsabilidades no ocorrido e ainda tentou transferir as razões de seu fracasso, mais uma vez, ao comportamento natural dela.
Vanessa descobriu que não adianta usar o sexo para tentar salvar o casamento. Quando um casamento dá sinais de fracasso, há muitas outras questões envolvidas e não é uma noite de fantasia, esbórnia, drogas e rock and roll que resolva isso.
A grande lição é que fantasias devem ser realizadas quando há cumplicidade, ou seja, quando o casal está na mesma vibração e com o mesmo propósito de se divertir.
Uma só vida.
É o que temos. E ainda sem saber quanto tempo ela durará.
Tendo essa única certeza desde que nascemos, de que vale essa vida se não nos arriscarmos e ousarmos cada dia? Permanecer num emprego que nos causa infelicidade, mas que garante estabilidade, dormir cedo sempre, nunca se atrasar, ir ao mesmo cinema, ao mesmo restaurante, a mesma balada; ter roupas sempre da mesma loja, tomar a mesma marca de cerveja: perda de tempo.
É como a velha e boa música de Chico Buarque: “Todo dia ela faz tudo sempre igual/ me sacode às seis horas da manhã/ me sorri um sorriso pontual/ e me beija com a boca de hortelã”.
Fomos educados à rotina. Acordar cedo para ir à escola, não se atrasar, fazer lição de casa todos os dias, almoçar no horário, não chegar tarde em casa, etc. Gostar de rotina não é ruim. Afinal, é ela que norteia nossas vidas e dá certa diretriz ao nosso dia a dia. Caso contrário, viveríamos num caos e desfocados. A rotina é de certa forma a força motriz que nos faz obedecer às regras e nos manter sãos, sem grandes transtornos psíquicos.
Sair da rotina, às vezes pode ser doloroso. Arriscar-se numa atividade nova, atrasar-se mais que cinco minutos ou experimentar uma comida exótica, nem sempre é fácil alcançar. Principalmente para quem tem sua vida toda cronometrada e disciplinada pelos relógios e suas regras _ acordar às seis, fazer ginástica, tomar banho e se arrumar em meia hora, tomar café lendo jornal, trabalhar incessantemente, voltar pra casa pelo mesmo caminho de sempre, assistir qualquer porcaria na televisão e dormir.
Desse modo, não nos permitimos experimentar algo novo e ousado, por mais simples que seja. Não nos damos o luxo de fazer um programa cultural em plena terça-feira, afinal, amanhã é quarta, dia de acordar cedo e trabalhar. Não nos permitimos nos atrasar um dia sequer, como naquele dia chuvoso e frio que nos faz ficar mais uns minutinhos na cama pela manhã. Não nos permitimos acordar após o meio-dia num domingo preguiçoso. E assim, a vida vai passando, nessa disciplinada, organizada, metódica e chata rotina.
Por muito tempo fui um pouco assim: metódica e intransigente (confesso que ainda sou meio rígida com horários e rotina, mas estou tentando mudar). Reconhecer que meu mundinho é limitado e que a zona de conforto não me oferece nada mais do que conforto, já é o primeiro passo. Num encontro entre amigas, se todas chegam no horário, acho ótimo. Se, algumas chegam atrasadas, me incomodo um pouco, mas hoje já espero as atrasadas feliz, e faço disso um motivo de risadas.
Viver metodicamente é não viver, ou viver pela metade. Partindo do pressuposto que temos uma só vida, melhor não desperdiçá-la.