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Vida de amante

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Ainda com pouca experiência de vida adquiri a percepção de que a palavra puta era um codinome sobre ser mulher.

Vi putas sendo chamadas de putas. Vi minha mãe, dona de casa, sendo assim intitulada pelo meu pai. Vi meus tios falando de mulheres que transavam por dinheiro e de suas mulheres – que trepavam de graça – da mesma forma. Vi situações, com pessoas desconhecidas, em que mulheres, por muito ou por pouco, também assim o eram batizadas.

Eu entendia a falta de requinte do termo, mas já não me ofendia. Éramos todas “mulheres-putas” no mesmo patamar de subgênero, que se diferenciavam apenas pelos centavos a mais  após o coito.

A minha surpresa veio quando me envolvi com um homem casado. Sem perceber, me tornei puta num submundo, onde se deve ser invisível, silenciosa e não se tem direito a argumentos.

As pessoas não entendem que eu não fiz um plano maléfico de destruição de famílias, na verdade eu conheci um homem solteiro e, aparentemente, disponível. Foram trinta e seis meses de relacionamento e, quando comecei a achar estranho ser sempre a minha vida o cenário da nossa relação: os meus amigos, a minha casa, os meus álbuns de família. Descobri que a dele era plano de fundo de um casamento de dez anos e dois filhos!

Ainda assim, passaram-se mais quatro anos de aniversários solitários e compromissos desfeitos para acompanhar sua agenda de escapadas. Eu sou apenas um ser humano que acreditou cegamente que era preciso ter paciência, fé e autocontrole.

Fui julgada pelos meus familiares, amigos e desconhecidos. Acobertei a situação o quanto pude. Até que encontrei, entre as diversas promessas não cumpridas, algumas que fiz a mim mesma. Senti vergonha. Chorei sozinha. Por não poder falar com ninguém, gritei em silêncio.

Eu simplesmente não tinha valor frente àquela família que existia do lado oposto. Amante, por definição, é aquele que ama. E, acima de todos os julgamentos alheios, nunca me envergonhei dessa condição. Mas, decidi dar um basta àquela sequência de humilhações que me tirou o amor-próprio e transformou uma mulher apaixonada em uma espécie de vilã de famílias perfeitas.

Fui condenada por todas as pessoas que souberam da minha história, fiquei por anos em uma solitária esperando ansiosamente pela visita do carcereiro. O meu despertar foi encontrar no bolso a chave que me tirava dessa cela. Não foi fácil, mas decidi ser uma puta livre.

 

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